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Acordo histórico na União Europeia busca proteger direitos de trabalhadores de apps

Na contramão de medidas recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro, que vem derrubando decisões da Justiça do Trabalho reconhecendo o vínculo empregatício entre aplicativos e motoristas e entregadores, o Parlamento Europeu chegou a um acordo histórico, na quarta-feira passada (13), para a aprovação de uma legislação mais protetiva aos 30 milhões de profissionais de plataformas digitais de todo o bloco.

A “diretiva”, como é tecnicamente classificada a proposta, foi longamente negociada e ainda precisa ser oficialmente aprovada pelo Parlamento e pelo Conselho Europeu. Caso isso aconteça, precisará ser referendada pelos congressos nacionais para entrar em vigor em cada país.

“Esse é um acordo revolucionário e o primeiro marco legislativo para os trabalhadores de plataformas digitais”, afirmou a euro-deputada italiana
Elisabetta Gualmini, logo após o anúncio sobre o acordo. “Teremos transparência e responsabilidade sobre os algoritmos, teremos mais direitos para os trabalhadores menos protegidos do mundo”, acrescentou.

O que diz o texto
Inspirada na chamada “Lei Rider”, da Espanha, a diretiva estabelece critérios básicos para definir se uma pessoa é ou não empregada de fato de um aplicativo. Esses indicadores levam em conta, por exemplo, a autonomia para negociar remuneração, o controle sobre a jornada de trabalho e a obrigatoriedade do uso de uniformes.

De acordo com dados do próprio Parlamento Europeu, estima-se que pelo menos 5,5 milhões de trabalhadores de aplicativos se enquadrem na categoria de “falsos autônomos”. Segundo os críticos do atual modelo, são pessoas que, em virtude do sistema de trabalho adotado por alguns aplicativos, deveriam ter acesso a direitos típicos de empregados, como férias remuneradas e descanso obrigatório, mas que são indevidamente tachadas de autônomas.

Mas nem todos os motoristas, entregadores, garçons e faxineiros — para citar as categorias mais comuns — vão ser categorizados como empregados. Em entrevista à coluna, a professora do curso de Direito da Universidade do Minho, de Portugal, Teresa Coelho Moreira, explica que não haverá uma “reclassificação automática” de todas as pessoas que trabalham em plataformas digitais, caso a legislação seja aprovada.

Na prática, o que a diretiva pretende é “facilitar a prova para quem considera que tem um contrato de trabalho subordinado e não um trabalho autônomo ou independente”, complementa a professora. “Mas nada impede que as plataformas venham dizer que, apesar de estes índices estarem provados, não se trata de um contrato de trabalho”, ressalva.

Controle sobre algoritmos
Além de estabelecer critérios mais claros para a definição de vínculo empregatício, com o intuito de evitar que plataformas burlem o pagamento de direitos trabalhistas, a diretiva em discussão no Parlamento Europeu também traz importantes novidades sobre a chamada “gestão algorítmica”.

Dentre outras coisas, o texto proíbe que decisões relevantes, como a suspensão de trabalhadores das plataformas por eventuais infrações, sejam tomadas de forma automática por inteligência artificial, sem a supervisão de um ser humano.

Além disso, a diretiva amplia a transparência de dados, facilitando o acesso dos trabalhadores às informações geridas pelas plataformas sobre ganhos e desempenho.

E no Brasil?
Por aqui, ministros do STF têm revertido ao longo do ano uma série de decisões da Justiça do Trabalho que apontam a existência de vínculo empregatício entre plataformas e motoristas e entregadores, nos moldes previstos pela CLT (Consolidações das Leis do Trabalho).

Além disso, os ministros da suprema corte vêm formando posição para que casos envolvendo profissionais de aplicativos sejam analisados pela Justiça Comum, e não pela Justiça do Trabalho. Críticos afirmam que essas medidas esvaziam o papel especializado do judiciário trabalhista e afrouxam a proteção desses profissionais.

Diante desse cenário, o governo federal criou uma comissão especial em Brasília para costurar um acordo entre trabalhadores e plataformas e subsidiar um Projeto de Lei (PL) endereçado ao Congresso Nacional.

A ideia era estipular algumas garantias, principalmente de remuneração mínima e de cobertura previdenciária.

A aposta era de que um eventual pacto gerasse segurança jurídica e reduzisse o número de ações judiciais sobre o tema. Porém, não houve consenso entre as partes. O governo ainda estuda a possibilidade de apresentar ao Congresso um PL para regulamentar o trabalho por aplicativos no país.

Fonte: Coluna Carlos Juliano Barros no UOL