Arthur Lira aceita pedido do PL e abre processo de cassação contra 6 deputadas progressistas
Especialista diz que violência de gênero afasta mulheres da política partidária no Brasil
As mulheres ocupam apenas 18% das cadeiras na Câmara dos Deputados, porém representam 63% dos parlamentares que enfrentam processos de cassação de mandato no Conselho de Ética. Apenas na última semana seis deputadas progressistas foram parar no Conselho de Ética depois que o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), aceitou o pedido do PL protocolado dias antes, mesmo havendo pedidos mais antigos contra parlamentares homens, que estão parados na Mesa Diretora.
A representação do PL tem como base os discursos das deputadas com críticas aos colegas durante a votação do PL 490, que trata sobre marco temporal para demarcação de terras indígenas. Foram incluídas as deputas Célia Xakriabá (PSOL-MG), Érika Kokay (PT-DF), Fernanda Melchionna (PSOL-RS); Juliana Cardoso (PT-SP), Sâmia Bonfim (PSOL-SP) e Talíria Petrone (PSOL-RJ). Juliana e Tarília já respondiam a processos no Conselho por críticas que tinham feito aos deputados do PL.
As deputadas alegam que há uma tentativa deliberada de intimidar o trabalho das mulheres na Câmara dos Deputados.
“A representação do PL é uma nítida e ineficaz tentativa de nos intimidar e tem um forte componente sexista. Nós não vamos recuar e seguiremos ainda mais fortes na defesa dos direitos dos povos indígenas e de todo o povo brasileiro”, destacou Érika Kokay.
A parlamentar do Distrito Federal lembrou que o PL, autor da representação que pede cassação dos mandatos, é o partido do ex-presidente Jair Bolsonaro que foi denunciado na Organização das Nações Unidas (ONU) por crimes contra os povos indígenas.
“Foi com indignação que reagi à representação do PL pedindo a cassação do meu mandato por denunciar o genocídio indígena que representa o projeto do novo Marco Temporal”, acrescentou a deputada.
Além das seis deputadas do campo progressista outra parlamentar com processo no Conselho de Ética é Carla Zambelli (PL-SP). Por outro lado, quatro homens enfrentam pedidos para cassação de mandato: Eduardo Bolsonaro (PL-SP), e José Medeiros (PL-MT), Márcio Jerry (PCdoB-MA) e Nikolas Ferreira (PL-MG).
O Brasil de Fato DF entrou em contato, por e-mail, com a Assessoria de Imprensa da Câmara dos Deputados para saber sobre a tramitação e motivos da celeridade na aceitação dos pedidos, mas até o fechamento desta matéria não obteve resposta. O espaço está aberto para futuras manifestações.
Mudança nos processos
Esta é a primeira vez nos últimos vinte anos que foi apresentado no Conselho de Ética da Câmara um pedido de cassação coletiva. No entanto, na segunda-feira (12), o PL solicitou a retirada da tramitação do pedido de cassação coletiva e apresentou seis pedidos de perda de mandato individuais contra as parlamentares. A solicitação também foi atendida pelo presidente da Casa, Arthur Lira.
“Agora, querem entrar individualmente contra cada uma de nós. A coletividade os assusta. Seja individual ou coletivo, seguiremos juntas, nos apoiando e ecoando nossas vozes”, afirmou a deputada Célia Xakriabá após a mudança, em suas redes sociais.
“O que é inusitado é que a Câmara acaba dando uma celeridade maior a esses processos do que a outros que estão lá há muito tempo de pessoas que nitidamente cometeram crimes. A peça, se você espremer, essa representação que eles fizeram, só sai dali misoginia, só sai dali violência política de gênero e violência contra os povos indígenas”, destacou Érika Kokay.
Violência de gênero
Para a professora e pesquisadora do Instituto de Ciências Políticas da Universidade de Brasília (Ipol/UnB), Michelle Fernandez, o episódio pode ser classificado como violência de gênero. “Me parece um caso de violência de gênero sim, com o claro intuito de desestimular a participação de mulheres nas esferas de poder”, analisou a cientista política.
A pesquisadora lembrou que o parlamento brasileiro tem uma das menores taxas de representação feminina da América Latina e classificou a política partidária do Brasil como “hostil para as mulheres”.
“Não é nenhuma novidade que nós temos um legislativo que desestimula a participação de mulheres e que oferece esse tratamento machista”, afirmou Michelle Fernandez. Segundo ela essa tentativa de cassação se caracteriza por um ímpeto silenciar as mulheres que é muito comum nos espaços de poder do Brasil.
Fonte: Brasil de Fato