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Disputa no governo Lula expõe temor que combate à escravidão fique fragilizado

A disputa entre dois ministérios do governo Lula pela Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) tem preocupado pessoas que atuam no setor.

O que aconteceu

Atualmente, a comissão está dentro do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, comandado por Silvio Almeida. Mas uma proposta prevê levar o órgão responsável pelo acompanhamento do combate ao trabalho análogo à escravidão para o Ministério do Trabalho, chefiado por Luiz Marinho.

A ideia da mudança surgiu no Ministério do Trabalho. Em abril, a pasta encaminhou à Casa Civil uma minuta de decreto que mudaria o órgão de lugar.

Entidades civis e pessoas ligadas ao tema lançaram uma carta de apoio à permanência da Conatrae na pasta dos Direitos Humanos. Desde que foi criada em 2003, a comissão sempre esteve ligada ao ministério ou à Secretaria de Direitos Humanos (quando não havia pasta).

Há um entendimento de que trabalho escravo é uma violação de direitos humanos, e não apenas uma questão trabalhista. Por isso, é preciso uma ação mais ampla.

Como o Ministério do Trabalho é o principal executor da política nacional na área, não seria coerente que o órgão que fiscaliza a implementação dessa política esteja subordinado a ele.

Outra alegação apresentada é que no texto do decreto sugerido há brecha para a Conatrae propor atos normativos, que eventualmente podem enfraquecer a política pública no país.

Quem atua na área teme, por traz disso, a movimentação de entidades ruralistas para enfraquecer normas e instrumentos de combate à escravidão moderna. Entre eles, a divulgação da lista suja de quem pratica o crime.

Em nota, o Ministério dos Direitos Humanos defendeu a permanência da Conatrae na pasta porque “se trata de uma política de direitos humanos.” Procurada, a pasta do Trabalho não respondeu.

“Isso foi feito em consonância aos tratados internacionais assinados pelo Brasil na área, pela natureza do crime de trabalho escravo e abrangência das violações que ele produz, pela transversalidade e intersetorialidade das ações suscetíveis de contribuir na sua erradicação”, Ministério dos Direitos Humanos.

A mudança de pasta é motivo de preocupação por haver risco de retrocesso. A opinião é de Frei Xavier Plass, que está na Conatrae desde sua fundação e é integrante da coordenação da CPT (Comissão Pastoral da Terra).

“Trabalho escravo é uma é descrito como um crime contra a humanidade, então não é só combater uma condição trabalhista: ela tem componentes variados e, para erradicar, tem que ter ações transversais”, Frei Xavier Plass.

Luciana Conforti, presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), explica que a Conatrae é responsável pela fiscalização da política pública de combate ao trabalho escravo, enquanto que o Ministério do Trabalho atua na fiscalização.

“É importante que haja a permanência da Conatrae no MDH [Direitos Humanos] para que não haja o reforço de argumentos no sentido de que apenas se trata de violação trabalhista, como temos visto na jurisprudência e em vários projetos de leis que tentam enfraquecer o conceito do artigo 149 do Código Penal, que trata do conceito de trabalho análogo à escravidão”, Luciana Conforti.

O que é a Conatrae

O órgão tem como missão acompanhar e sugerir medidas para o cumprimento das ações constantes do Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo.

Também deve acompanhar e avaliar os projetos de cooperação técnica firmados entre o Brasil e organismos internacionais, propondo a elaboração de estudos e pesquisas e incentivar a realização de campanhas relacionadas à erradicação do trabalho escravo.

Ano de resgates

O ano de 2023 tem sido marcado por resgates de trabalhadores em situação análoga à escravidão, com destaque para uma operação resgatou 207 pessoas que atuavam na colheita e carga e descarga de uvas em Bento Gonçalves (RS).

Somente este ano, 1.201 pessoas tinham sido resgatadas de condições análogas a escravidão, segundo o Radar SIT, mantido pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Tratase de um painel de informações e estatísticas online sobre as inspeções de trabalho realizadas no país.

Fonte: Coluna Carlos Madeiro no UOL

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