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O covid-19 (novo coronavírus), as empresas e os sindicatos

Por Cesar Augusto de Mello

É muito importante que nesse momento de dificuldades e renúncias por parte de todos, que empregados e empregadores busquem soluções em consenso quanto aos problemas que surgirão dos reflexos da pandemia que afeta o planeta.

Tenho recebido consultas de trabalhadores, sindicatos, escritórios de contabilidade e até de RHs de empresas sobre como proceder se for necessário que os trabalhadores permaneçam em casa em razão do COVID-19 (novo coronavírus).

O momento é complexo e a melhor atitude a se tomar numa situação dessas é utilizar o bom senso e a razoabilidade, levando-se em conta que nem o trabalhador e nem a empresa deram causa ao transtorno que estamos vivendo. O intérprete das normas legais nesse momento não poderá desconsiderar o contexto de crise mundial que vivenciamos na saúde pública e que reflete na relação empregado/empregador.

Consolidação das Leis do Trabalho – CLT nos deixa algumas possibilidades legais para conduzir o assunto. Verifica-se que muitos empregadores estão apreensivos com a possibilidade real de seus empregados ficarem em casa por contaminação do propalado vírus.

Creio que qualquer decisão do empregador no sentido de afastar o trabalhador devido às atuais circunstância implica, ad cautelam, em convocar o Sindicato da categoria para discutir sobre as possibilidades, evitando-se assim informações desencontradas entre o empregador e a entidade sindical representativa da categoria.

De todo modo, vejamos:

– A CLT, em seu art. 59, § 2º prevê a possibilidade de se implantar banco de horas, ocasião em que os trabalhadores não prestarão seus serviços por um determinado número de dias e não terão prejuízo quanto aos salários, entretanto, retornando ao trabalho, trabalharão duas horas extras diárias até compensar as horas que deixaram de trabalhar e nessa condição não receberão por essas duas horas. Por se tratar de um tema que envolve coletivos, setor ou setores da empresa deverá o banco de horas decorrer de negociação com o Sindicato da categoria para maior segurança jurídica.

– Temos ainda a possibilidade das férias coletivas previstas no art. 139 e 140, ambos do texto consolidado. Como o negociado prevalece sobre o legislado, poderiam as partes, mediante acordo coletivo, abolir a necessidade de pré-aviso de 15 dias ao Ministério da Economia e ao Sindicato.

– A reforma trabalhista de 2017, possibilitou a prestação de serviços do empregador fora das dependências da empresa com a utilização de tecnologia da informação. Para algumas atividades esse contrato pode ser adotado com sucesso pelas partes envolvidas. Sua previsão está no art. 75-A e seguintes, da CLT.

– Temos ainda a possibilidade de licença remunerada – sem previsão expressa na CLT, mas plenamente possível.

– Outra alternativa seria a suspensão do contrato de Trabalho para cursos (“à distância”) de qualificação profissional – art. 476-A, da CLT

– Por fim, poderia ser negociada uma suspensão temporária do contrato de trabalho com pagamento de um abono mensal e manutenção de alguns benefícios previstos em norma coletiva da categoria (por exemplo cesta básica, convênio médico), pois o art. 611-A, da CLT informa que o negociado prevalece sobre o legislado em algumas situações.

– O empregado adoecido terá a proteção previdenciária, percebendo o auxílio devido por lei.

Ressalto que a negociação coletiva exige a realização de assembleias dos trabalhadores envolvidos e que, obviamente seria um contrassenso reunir dezenas, centenas ou milhares de trabalhadores num único ambiente para deliberações. A sugestão é que se utilizem da tecnologia para deliberação do tema com os trabalhadores. As empresas possuem os contatos telefônicos dos trabalhadores e os passariam ao sindicato da categoria que ficaria encarregado de, por exemplo, formar um grupo específico de WhatsApp para a comunicação dos atos e deliberações, se possível. Também os trabalhadores poderiam escolher uma comissão que ouviria internamente, na empresa, todos os trabalhadores e levaria a decisão para a entidade sindical. Enfim, temos que ser criativos e ponderados num momento de tanta apreensão.

Temos, por fim a previsão do art. 486, da CLT, a saber:

CLT .Art. 486 – No caso de paralisação temporária ou definitiva do trabalho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação da atividade, prevalecerá o pagamento da indenização, que ficará a cargo do governo responsável.

§ 1º – Sempre que o empregador invocar em sua defesa o preceito do presente artigo, o tribunal do trabalho competente notificará a pessoa de direito público apontada como responsável pela paralisação do trabalho, para que, no prazo de 30 (trinta) dias, alegue o que entender devido, passando a figurar no processo como chamada à autoria. (g.n)

§ 2º – Sempre que a parte interessada, firmada em documento hábil, invocar defesa baseada na disposição deste artigo e indicar qual o juiz competente, será ouvida a parte contrária, para, dentro de 3 (três) dias, falar sobre essa alegação.

§ 3º – Verificada qual a autoridade responsável, a Junta de Conciliação ou Juiz dar-se-á por incompetente, remetendo os autos ao Juiz Privativo da Fazenda, perante o qual correrá o feito nos termos previstos no processo comum.

No caso específico do COVID-19 não cremos que o Estado possa ser responsabilizado por eventual paralisação das atividades do empregador. Se trata de força maior. Assim, entendemos não haver sustentação acerca da aplicação do preceito supramencionado.

É muito importante que nesse momento de dificuldades e renúncias por parte de todos, que empregados e empregadores busquem soluções em consenso quanto aos problemas que surgirão dos reflexos da pandemia que afeta o planeta. Nós vamos ter que existir de forma diferente, isso é bem mais do que agir de forma diferente.

*Cesar Augusto de Mello é consultor jurídico FORÇA SINDICAL, CNTQ, FEQUIMFAR, SindirefSP, Sinprescamp e SindiLuta

Fonte: Migalhas .com.br

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