Operação resgata indígenas macuxi e venezuelanos em condições análogas à escravidão em Roraima
Galinheiro estava em melhores condições que barrocão onde viviam os sete trabalhadores resgatados, em Caracaraí (RR)
Uma ação fiscal iniciada em 16 de novembro resgatou sete trabalhadores em condições análogas à escravidão em uma fazenda em Caracaraí, centro-sul de Roraima. Entre as vítimas, estavam três indígenas macuxi e dois migrantes venezuelanos, um deles com situação migratória irregular.
A inspeção começou em um canteiro de obras em uma propriedade rural próxima ao distrito de São Luiz do Anauá, a partir de uma denúncia anônima no Disque 100. No local, eram construídos um berçário de mudas de açaí e a sede da fazenda, onde já havia infraestrutura para atividades de piscicultura.
Os trabalhadores estavam alojados na própria fazenda, em barracos de alvenaria e lona, sem nenhum conforto, higiene e segurança.
Nos últimos 14 anos, 860 estrangeiros foram resgatados em condições análogas à escravidão no Brasil.
“No alojamento de alvenaria, sem portas ou janelas, um casal dividia uma mesma rede para dormir enquanto outro trabalhador dormia na varanda. Outros quatro trabalhadores dormiam em barracões de lona, sem segurança ou proteção contra intempéries, dividindo o espaço com ferramentas de trabalho e produtos químicos, mantimentos”, descreveram os fiscalizadores.
A empresa acusada de escravizar os trabalhadores tem capital social de R$ 25 milhões. Além de atuar no cultivo de açaí e eucalipto, oferece serviços de construção e terraplanagem.
O resgate foi realizado por auditores-fiscais do Trabalho da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), vinculada ao Ministério do Trabalho e Previdência, em conjunto com integrantes do Ministério Público do Trabalho (MPT), do Ministério Público Federal (MPF), da Defensoria Pública da União (DPU) e da Polícia Rodoviária Federal (PRF).
O banheiro usado pelos trabalhadores era um cercado de madeira sem teto, e não havia água há pelo menos uma semana. Os sete resgatados faziam, então, as necessidades a céu aberto.
Eles tomavam banho em um açude, e passavam por um terreno lamacento na volta ao alojamento.
O cozinheiro morava desde julho em um galpão de chão batido, com frestas por onde entravam aranhas e escorpiões.
Bruna Quadros, auditora-fiscal do Trabalho que coordenou a operação, afirma que até o galinheiro da propriedade estava em melhores condições.
Além da falta de conforto, higiene e segurança, nenhum dos sete possuía registro em carteira de trabalho, e todos eram submetidos a jornadas exaustivas. Um deles trabalhava sem folga remunerada desde junho, fazendo horas extras sem nenhum tipo de compensação.
Após o resgate, o empregador firmou um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com o MPT e a DPU e pagou cerca de R$ 40 mil em verbas salariais e rescisórias, estipuladas pelos auditores.
Os sete resgatados receberam ainda três parcelas de um salário mínimo cada, como seguro-desemprego.
No TAC, também está previsto o pagamento de valores entre R$ 1 mil e R$ 3 mil, como dano moral individual, e de R$ 70 mil como dano moral coletivo.
Habitantes da bacia do Rio Branco, Rupununi e Orinoco, os indígenas macuxi enfrentam migrações forçadas desde o século 18. A situação vem se agravando com o avanço do agronegócio e do garimpo ilegal da região.
Os macuxi estão entre os habitantes da terra indígena Raposa Serra do Sol, homologada em 2005, objeto de julgamento histórico no Supremo Tribunal Federal (STF) em 2019, e defendida como modelo de gestão territorial.
Fonte: Brasil de Fato