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Robô do INSS já decide até 4 de cada 10 aposentadorias

Sistema automatizado do INSS já decide até 4 de cada 10 aposentadorias – Imagem: René Cardillo via Midjourney

O robô do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) já decide ao menos um terço dos pedidos de aposentadoria, pensão e auxílios feitos ao órgão. Em fevereiro, abril e maio desde ano, ele foi o responsável por quatro das 10 concessões de um dos mais importantes benefícios do trabalhador brasileiro.

No lugar de humanos analisando pilhas de papel, o processo automatizado libera a solicitação em segundos se dados e tempo necessário de contribuição estiverem ok. Se, por um lado, a adoção do robô agiliza o processo e tenta reduzir a imensa fila de pedidos, por outro, especialistas previdenciários ouvidos por Tilt apontam que:

  • o sistema recusa sumariamente pedidos por falta de documento; o INSS nega, dizendo que a taxa de concessão se manteve nos mesmos índices históricos, de 50%;
  • trata-se de um procedimento complexo e excludente, que não observa o alto analfabetismo digital entre idosos no país;
  • o atendimento presencial para retirar dúvidas foi comprometido com a perda de mais da metade do efetivo do INSS nos últimos anos – sem contar a falta de peritos

Do papel à automação

A guinada rumo à automatização começou em 2017, com a adoção do app Central de Serviços. Logo, ele deu lugar ao MeuINSS, que hoje é o principal canal de atendimento. É apenas por lá e pelo site correlato que as aposentadorias são solicitadas.

Antes tudo era analisado com papel para checar os vínculos, e cada etapa do pedido do cidadão era executada por um sistema diferente. Passamos a integrar as diferentes plataformas e usar o CPF como chave-primária [identificador único] para reunir as informações dos contribuintes”, Ailton Nunes, diretor de tecnologia de informação do INSS.

Especialistas ouvidos por Tilt contam que a aposentadoria só sai em casos em que o processo é perfeito. Ou seja:

  • sem inconsistências no CNIS (Cadastro Nacional de Informações Sociais): todas as datas de entrada e saída de empregos e o salário de contribuição, por exemplo, foram inseridos corretamente no sistema.
  • sem vínculos abertos: registro correto de saída de um emprego, para evitar que, entendendo erradamente que o contribuinte está trabalhando, o sistema deixe de conceder o benefício.

O problema é que, como há muitos erros de cadastro, o sistema indefere o benefício sem margem para correção.

“O robô tira essas pessoas de uma fila e as coloca em outra, de recurso”, Adriane Bramante, presidente do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário).

Estima-se que a fila da aposentadoria tenha 1,7 milhão de pessoas, enquanto a de análise de tarefas pendentes tenha 7,6 milhões.

Segundo o INSS, o robô se mantém na taxa histórica e concede metade dos pedidos feitos na fase inicial. Como o IBDP trabalha auxiliando pessoas a se aposentarem, Abramante considera que o processo poderia ser mais eficiente.

Antes de negar o benefício, o sistema deveria identificar o erro daquele processo, encaminhar uma exigência para o segurado e levar para um servidor, de modo que ele possa conferir se aquele pedido de aposentadoria deve ser negado ou não. Desses 50% indeferidos [negados], talvez 20% ou 30% poderiam ser corrigidos, se tivesse havido um encaminhamento para um humano”, Adriana Abramante, IBDP.

Além disso, nem todos os registros de beneficiários estão digitalizados, enquanto alguns nem chegam a constar nos sistemas, conta Cristiano Machado, diretor do Fenasps (Federação Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social).

Isso obriga o trabalhador a estar pronto para passar por um processo comprobatório e ter, por exemplo, cópia da carteira de trabalho para inserir no MeuINSS e corrigir informações. Para o INSS, isso não chega a ser um problema.

“Às vezes o cidadão insere seus dados, e o sistema puxa uma informação. Por algum motivo, um vínculo empregatício não apareceu e ele pensa: ‘ué, mas não estava no INSS?’. As pessoas têm a possibilidade de fazer a inclusão dessa informação e, assim, fazermos uma análise diferenciada”, Ailton Nunes, do INSS.

O diretor do instituto reconhece que há melhorias a serem feitas. “Há alguns anos, tínhamos só a agência, e agora você tem o agendamento via MeuINSS e até automação na operação de uma instituição centenária. Estamos melhorando o processo aos poucos”, disse.

Perda de servidores e dificuldades no atendimento

A automação não foi só uma questão modernizante, mas uma tentativa de suprir com uso de tecnologia o déficit de servidores do órgão — nos últimos anos, houve perda de mais da metade do efetivo.

O processo de digitalização de processos do INSS é discutido desde 2015, quando já se sabia que metade da força de trabalho do órgão poderia se aposentar em meados de 2019. Isso aconteceu gradualmente.

Entre 2015 e 2020, muitos servidores que entraram no órgão na década de 1980 se aposentaram devido a uma gratificação, criando uma baixa de quase 20% do efetivo. Nos cálculos do Fenasps, hoje há 23 mil cargos vagos no órgão, e 19 mil ativos. Desde então, foram feitos dois concursos. Em 2015, foram 950 vagas, e, em 2022, 1.000 postos.

“Há cerca de 1.500 agências no país. Com este último concurso, não dá nem um servidor para cada agência”, Cristiano Machado, diretor do Fenasps.

O próprio INSS diz que a automação ajuda, mas contratar mais servidores ainda é crucial.

“A tecnologia vem para simplificar o processo, mas ainda precisamos de pessoal. Queremos que a automação resolva questões simples, e o que for complexo fique para os servidores analisarem”, Ailton Nunes, diretor de tecnologia do INSS.

Vó, você sabe gerar um arquivo PDF?

A falta de pessoal acaba influenciando diretamente no atendimento. Com a migração dos pedidos de aposentadoria para o MeuINSS (via app ou site), as agências passaram apenas a tirar dúvidas (mediante agendamento) e a realizar perícias, quando é o caso.

Se apresentar documentos em papel presencialmente não é mais necessário, agora o processo exige escanear arquivos e salvá-los em formato PDF.

Muitas vezes, o grupo de pessoas que busca o benefício é analfabeto digital, não tem computador nem telefone celular. Mesmo para agendamento, só é possível fazer ligação de um telefone fixo — o que complica a vida de quem não tem uma linha fixa. Está completamente desconectado da realidade”, Adriane Bramante, do IBDP.

Ainda que se apoie cada vez mais em sistemas tecnológicos, o sistema sofre com constantes indisponibilidades. Quando isso ocorre, servidores e beneficiários ficam impedidos de acompanhar ou fazer alterações em pedido.

Desde o começo do ano, foram 51 instabilidades em sistemas do órgão, segundo a própria instituição. O INSS só informa, porém, as ocorrências (manutenção ou problemas) com mais de três horas.

Até agosto, o MeuINSS teve 19 instabilidades, e o CNIS, onde as informações dos trabalhadores são consultadas, teve 22.

“Entre fevereiro e março, chegamos a ficar de 15 a 20 dias sem sistema durante o horário comercial de trabalho. Nossos sistemas são extremamente precários e de difícil operacionalização”, Cristiano Machado, diretor do Fenasps.

O INSS diz que tem melhorado os processos. O órgão argumenta que 18 mil servidores acessam esses sistemas, mas há, ao todo, 300 mil pessoas que interagem com eles. Isso estava causando grande instabilidade.

Para contornar a sobrecarga, o instituto informa que tem investido em infraestrutura para modernizar sistemas. Uma das ações tomadas, por exemplo, é a absorção das operações assíncronas.

As informações são, por exemplo, inseridas em um sistema e só processadas fora do horário comercial para não comprometer as operações “ao vivo” de maior importância.

Fonte: Tilt/UOL

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