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Como as empresas podem se alinhar a pauta ESG e serem antidiscriminatórias?

Você piscou e mais uma sigla surgiu nas conversas: ESG. Ou a extensão do que ela significa em Environmental (Ambiental), Social (Social) and Governance (Governança), que numa explicação objetiva e rápida, trata sobre as estratégias urgentes adotadas por empresas para que reduzam os impactos de uma sociedade menos desigual, racista, xenófoba, homofóbica e misógina.

Mas como isso poderia ser feito? Será que existem caminhos a serem investigados como possíveis dentro do cenário corporativo, e que interfira, de fato, na realidade vivida todos os dias por milhões de pessoas?

Na semana em que se comemora o Dia da Consciência Negra, e que foi precedida por mais um caso de de discriminação acontecido no Rio, em que uma funcionária de uma loja acusou uma cliente negra de furto, a coluna entrevista o advogado gaúcho Fabiano Machado da Rosa, especialista em Direito Empresarial, que acaba de lançar, junto da advogada Luana Pereira da Costa, especialista em Direito Antidiscriminatório, a obra “Compliance antidiscriminatório” (Thomson Reuters).

Na conversa com Fabiano, indicativos que servem de alerta às companhias que seguem centradas exclusivamente no lucro financeiro, esquecendo do principal: o engajamento e disposição para combater as feridas abertas de um país chamado Brasil.

Edu Carvalho: Antes de tudo: o que é preconceito e o que é discriminação? Fabiano Machado: Preconceito é conceito, e como conceito, ideia. E a ideia está dentro da cabeça do indivíduo. Discriminação é ação, e como ação, ela é concreta e acontece na vida, gera efeitos para terceiros. E isso é contra a lei, isso é crime.

Edu Carvalho: O livro acaba por fazer apontamentos importantes sobre o impacto da discriminação nas empresas. Como foi o processo de análise desses episódios? Fabiano Machado: Os casos escolhidos para o livros seguiram uma curadoria com alguns critérios, sendo eles: envolvimento de grandes companhias, porque influenciam para o bem e para o mal o mercado; casos que geraram processos judiciais com decisão em trânsito em julgado, porque não queríamos dar opiniões sobre os casos, queríamos relatar as consequências concretas e finais sobre; e a reverberação midiática, pra mostrar o quanto esses casos geram prejuízos reais em faturamento, de marca, imagem, engajamento. E um parâmetro: encontrar casos que cobrissem diferentes tipos de discriminação. Passamos e fizemos a reunião de todos os tipos de discriminação, seja de orientação sexual, gênero, raça, estética, algorítmica, etarismo e até capacitismo.

Edu: Existe maneira das empresas ficarem atentas ao que acontece não somente nos maiores cargos ou situações internas? Por exemplo, no atendimento a um cliente? Fabiano: As grandes empresas precisam, mais do que nunca, olhar pra dentro de seus ambientes internos e compreender como está sua cultura e como ela pode ser transformada, aperfeiçoada, melhorada.

É totalmente possível as empresas acompanharem a conduta dos seus colaboradores, desde seus cargos mais iniciais, até os cargos de direção. Isso se dá através de mecanismos de gestão de risco, educação continuada, treinamentos, construção de relações não violentas, códigos de ética de conduta que tenham parâmetros antidiscriminatórios. As empresas precisam entender a importância de terem um compliance com visão antidiscriminatória. Isso vai permitir a prevenção, através da cultura; o gerenciamento das crises, por meio de procedimentos desenhados e respeito a valorização e inclusão; e no momento posterior, o que fará que uma empresa, aos poucos, deixe de ter uma conduta discriminatória, buscando um posicionamento realmente de diversidade, inclusão, da inovação. A empresa que entende isso, é aquela que está pronta para o ambiente do futuro.

Edu: A discriminação racial é, ainda hoje, a maior ferida a ser combatida dentro e fora do ambiente das empresas? Fabiano: A discriminação racial é hoje o maior desafio à democracia do Brasil, e por isso, o maior desafio também no ambiente corporativo. Num país que tem mais de 50% de pretos e pardos, ele precisa entender a importância do combate ao racismo, juntamente com os outros preconceitos. E numa visão que agrega. Ao mesmo tempo, ter um posicionamento ético de defesa da dignidade humana, ao lado de posicionamento de mercado, que deve compreender que os negócios precisam gerar identificação, engajamento, fidelização a imagem e reputação. A discriminação racial é real, ela existe, está dentro das empresas, é estrutural, institucional e também recreativa. E ela exige das empresas medidas proativas, com metas claras, com objetivos e comprometimentos das altas gestões em criar gestões que sejam antifascistas. Isso vai de mudança em código de ética, revisão do mapa de risco, abertura de vagas, diversidade nos conselhos de alta gestão, comunicação interna, letramento racial. Não se combate a discriminação de forma natural. É preciso ser propositivo, ativo e a partir de decisões concretas que possibilitem empresas que não toleram e não praticam nenhuma forma de racismo nas suas ações internas ou externas.

Edu: Como ampliar noções e ações antidiscriminatórias nesse aspecto? Fabiano: Diversidade e inovação tem tudo a ver com a posição do mercado, sob a compreensão do que é ESG; com a sustentabilidade e com um consumo consciente, que marcará com certeza as atitudes das novas gerações. E que não aceitam mais consumir de companhias, frequentar ambientes, estarem em locais que sejam marcados pela discriminação, pela segregação e conduta violenta. Quando falamos de discriminação, falamos de violência. Mais do que tudo, violência não combina com negócio, sustentabilidade ou lucro. Empresas que entendam essa mudança, o novo mindset, são aquelas que, mais do que nunca, sabem que os negócios precisam ser bons pra todos, todas e todes

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Fonte: Coluna Eduardo Carvalho Universa/UOL

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