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Entidades pedem R$ 100 milhões ao Assaí por caso de homem negro obrigado a se despir

Entidades civis ligadas ao movimento negro entraram com uma ação civil pública pedindo indenização de R$ 100 milhões ao Assaí por danos morais coletivos, pelo caso do homem negro obrigado a se despir para provar que não havia furtado produtos do supermercado.

A ação foi protocolada na tarde desta quarta-feira (11) pela Educafro e pelo Centro Santo Dias de Direitos Humanos da Arquidiocese de São Paulo. Elas argumentam que a abordagem foi ilícita e vexatória e que também atingiu a população negra e o povo brasileiro.

O episódio aconteceu na última sexta-feira (7), numa unidade do Assaí em Limeira (SP). Luiz Carlos da Silva, 56, estava saindo da loja quando foi acusado por um segurança de ter furtado itens do supermercado. Cercado por uma equipe de funcionários, ele foi obrigado a tirar a roupa, chegando a ficar apenas de cueca na frente de outros clientes.

“Trata-se de mensagem pública, cujo propósito era o de chocar a sociedade […]. A comunidade brasileira é afetada a um só tempo por referido ato grave de racismo e violação a direitos humanos”, diz o texto da ação civil.

Em nota, o Assaí disse não ter recebido a citação da ação pública e afirmou que vai analisá-la quando tomar conhecimento.

As entidades alegam ter havido racismo estrutural e afirmam que a abordagem viola dois princípios fundamentais da Constituição: o de proteção à dignidade da pessoa e de proteção à população negra contra o racismo.

“Refere-se aqui ao racismo como prática velada, a qual não precisa ser revelada de forma verbal e explícita”, diz o texto do documento. “Assim, não é preciso que a violência seja expressamente decorrente de ódio ou discriminação racial para se lhe reconheça o caráter racista: basta que ela se revele como reprodutora da violência sistêmica que comprovadamente se abate sobre a afrodescendência brasileira”, acrescenta.

Educafro e o Centro Santo Dias são as mesmas entidades que processaram o Carrefour em ação semelhante sobre o caso de Beto Freitas —homem negro morto após ser espancado por seguranças em uma unidade do supermercado em Porto Alegre.

Em junho deste ano, o processo foi encerrado após o Carrefour fechar um acordo de R$ 115 milhões. O TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) determinou que o valor fosse encaminhado a ações de combate ao racismo.

“O que existe de comum no fato de Porto Alegre, o caso do Atakarejo em Salvador e agora o do Assaí é que são sempre pessoas negras. Há uma suspeição recorrente sobre pessoas negras e esse padrão precisa ser excluído”, afirma Marlon Reis, advogado que representa as duas entidades.

Segundo ele, a ação contra o Carrefour serve de precedente para o caso do Assaí. “Aquela foi a primeira vez que se arguiu, numa ação coletiva, a tese do racismo estrutural”, afirma.

Além da indenização de R$ 100 milhões, as entidades pedem a imposição de uma série de medidas ao Assaí, a fim de evitar que a conduta se repita.

Entre as obrigações mencionadas estão a contratação de um quadro próprio de seguranças com treinamentos em direitos humanos; a inserção de cláusulas antirracistas em contratos de fornecedores e prestadores de serviços; e a permissão para que todos os clientes filmem abordagens realizadas na empresa.

As entidades também pedem que o Assaí crie canais de denúncia e um conselho de segurança com participação de membros da sociedade civil, e invista um percentual do lucro em instituições de combate ao racismo.

Para Marlon Reis, essas são ações que visam mexer no DNA da empresa. “Esses pedidos criam uma série de medidas para minorar a possibilidade de reiteração desse tipo de conduta”, afirma.

Caso aceita, a indenização será revertida a um fundo público, controlado por representantes da sociedade. Entidades podem apresentar projetos para promover a aplicação desses valores.

Outra alternativa é que as partes cheguem a um acordo para definir uma destinação específica. Contudo, o advogado lembra que o valor não é pago às entidades propositoras. “Elas não têm vantagem financeira alguma com essa indenização.”

Marlon também diz que ações como essa não prejudicam a vítima. “Os direitos dele são totalmente preservados. São questões diferentes, uma coisa é a coletividade, outra coisa são os direitos individuais.”

Fonte: Folha de S.Paulo

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