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Levanta mina, descobre o peito, vai à luta e constrói o mundo novo

Chiquinha Gonzaga, cantora e compositora, na juventude

Por Marcos Aurélio Ruy

Para homenagear o Dia Internacional da Mulher – 8 de março –, a seleção desta edição conta somente com autoras importantes da música popular brasileira. De Chiquinha Gonzaga (1847-1935) a MC Carol, as canções retratam a condição da mulher que sobrepuja o momento e vai à luta para se impor num mundo dominado pelo patriarcado opressor e rude.

Neste momento sombrio falar dessas nove compositoras e cantoras escolhidas, significa falar da história do Brasil. Elas mostram as mudanças na luta pela emancipação feminina. Na arte, no mundo do trabalho e na vida, as mulheres foram se impondo, resistindo, desconstruindo o conceito de Amélia, a “mulher de verdade” porque conformada e submissa.

A resistência das mulheres através da história, que hoje conservadores tentam negar, construiu esta nação desde a escravidão, onde o trabalho das mulheres elevou o patamar de vida do país. Aqui elas falam por elas. Não que não existam autores voltados para essa importante mudança ao retratar a vida como ela é, mas sempre vislumbrando a possibilidade de mudança com elas à frente. Mas a voz delas ressoa em nossos ouvidos e mentes e aguçam a vontade de se unir a elas para acabar de vez com todo tipo de opressão.

Chiquinha Gonzaga
Uma das mais importantes vozes femininas da música popular brasileira, a carioca Chiquinha Gonzaga (1847-1935) deveria se conformar em ser dama da corte, mas como uma mulher à frente do seu tempo se impôs e se transformou na grande compositora que inovou a nossa música popular. Foi selecionada “Lua Branca” porque sua história já mostra a fibra dessa mulher. Essa modinha foi composta em 1912 para a opereta Forrobodó, mas em 1929 entrou em cena uma versão com letra modificada da música. Chiquinha teve que processar pelo plágio de sua melodia. Sua autoria ficou comprovada, mas permaneceu a letra, que nunca se soube a autoria.
“Oh, lua branca de fulgores e de encanto
Se é verdade que ao amor tu dás abrigo
Vem tirar dos olhos meus o pranto
Ai, vem matar essa paixão que anda comigo”

Luas Branca (1912), de Chiquinha Gonzaga; interpretação de Luiza Lara

Dona Ivone Lara
A primeira mulher a fazer parte da ala de compositores de uma escola de samba, a Império Serrano, a carioca Dona Ivone Lara (1922-2018) se destacou com uma voz imponente, com poesias narrando a vida das mulheres nos morros cariocas. Conhecida como a Dama do Samba, sua obra está consagrada na história da música popular brasileira. “Sonho Meu” argumenta que a “madrugada fria” só traz “melancolia” por causa da ausência de companheirismo dos homens.
“Sinto o canto da noite na boca do vento
Fazer a dança das flores no meu pensamento
Traz a pureza de um samba
Sentido, marcado de mágoas de amor
Um samba que mexe o corpo da gente
E o vento vadio embalando a flor”

Sonho Meu (1978), Délcio Carvalho e Dona Ivone Lara

Rita Lee
A roqueira paulista Rita Lee é um dos grandes nomes da MPB. Ela despontou nos Mutantes, nos festivais dos anos 1960, e nunca mais saiu das corações e mentes dos brasileiros. Em “Cor de Rosa Choque” canta que o “sexo frágil não foge à luta”, então “não provoque” porque “é cor de rosa choque”.
“Sexo frágil
Não foge à luta
E nem só de cama
Vive a mulher

Por isso, não provoque
É cor de rosa choque”

Cor de Rosa Choque (1982), de Rita Lee e Roberto de Carvalho

Leci Brandão
Outra sambista carioca, Leci Brandão, atualmente deputada estadual pelo PCdoB em São Paulo, apresenta uma obra voltada para as questões sociais e políticas. Envolvida nos movimentos por igualdade de gênero. “Dona Maria Segura” trata da vida de tantas Marias por este país afora labutando para segurar o rojão e avançar para uma vida melhor para todas as pessoas.
“Dona Maria é quem sabe se é óleo ou gordura
Ela manda na cozinha
Ela bate a carne dura

Dona Maria é que reza
Sabe da planta que cura
Ela lava, ela varre, ela passa
Que Deus proteja essa tal criatura”

Dona Maria Segura (2008), de Leci Brandão

Marisa Monte
Outra carioca se destaca na MPB com grande versatilidade e talento. Em parceria com Arnaldo Antunes (paulista) e Carlinhos Brown (baiano) ela mostra que “Não É Fácil” ser mulher num país tão machista e opressor. Ainda mais neste momento onde o conservadorismo destruidor de sonhos e vidas avança.
“Se você quisesse ia ser tão legal
Acho que eu seria mais feliz
Do que qualquer mortal
Na verdade não consigo esquecer
Não é fácil
É estranho”

Não É Fácil (2000), de Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown e Marisa Monte

Tulipa Ruiz
Como mais um talento revigorante da MPB, a paulista Tulipa Ruiz esbanja talento em obras coladas na realidade e no sonho de tudo mudar para a construção de um país baseado no respeito e no amor.
“Descobre o peito
Pinta a boca e beija o espelho
Que reflete a silhueta que você acabou de descobrir
Perfuma a nuca,
Perfuma o pulso,
Sente o seu perfume
E sai de salto por aí”

Da Menina (2010), de Tulipa Ruiz

Joana Knobbe
Paulista de nascimento, mas radicada em Natal, no Rio Grande do Norte, Joana Knobbe é uma das novas vozes femininas mais destacadas do momento. E sua obra, melodia e poesia se unem numa simbiose ímpar. Nesta canção ela canta “que a vida não espera”. É preciso viver, resistir e se impor.
“É hora de acordar
Vem, vamos andar
Colher flores e pedras
O mar
É tão amplo
Há sempre um caminho pra se chegar lá

Vem, vamos brincar
Que a vida não espera
No choro, ou no grito
Há sempre um sorriso que vai se firmar”

Lila (2018), de Joana Knobbe

MC Carol
Já a rapper carioca MC Carol canta a revolta da mulher que luta para superar o medo e conquistar o seu lugar negado pelo preocnceito, se valorizando neste mundo que insiste em pôr a mulher para baixo, para tentar impedir que ela mude o mundo com valorização de sua vida.
“Se valorizar
Não é querer ser melhor que alguém
É entender que você não é pior que ninguém

Levanta mina
Olha pra cima
Sente esse clima
Amor próprio é nosso rolê”

Levanta Mina (2021), de MC Carol

Pitty
A roqueira baiana Pitty desconstrói o conceito de Amélia, retratando com rara felicidade que a mulher mudou. Essa mudança transformou o mundo e abriu caminho para o novo com a cara e a coragem que só as mulheres têm.

Desconstruindo Amélia (2009), de Martin Mendonça e Pitty

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