Como catadora mudou a visão de negócio de diretora de multinacional
“Eu não mando em ninguém. Aqui tudo se faz em conjunto. Eu apenas lidero.”
As afirmações acima poderiam ter sido ditas pelo CEO de uma grande empresa. Entretanto, são palavras de Dona Rosa Queiroz, catadora de latinhas, dirigente da Cooperativa Coral de Alagoinhas, para Elisangela Matos, diretora de sustentabilidade da Ardagh Metal Packaging Brasil, líder global no fornecimento de latas de metal para bebidas.
À frente das iniciativas de sustentabilidade da empresa, a executiva conta como a sabedoria de Dona Rosa fez com que ela mudasse diversos pontos de sua visão de negócios. Na entrevista a seguir, ela fala também como o trabalho dos catadores e catadoras é essencial para a cadeia produtiva de reciclagem, sobre o destaque das lideranças femininas e por que a história de Dona Rosa, afinal, tem tanta conexão com sua própria história.
Ecoa: Dona Rosa Queiroz é uma catadora de latinhas que chamou sua atenção como executiva de uma grande empresa. Por quê?
Elisangela Matos: A Ardagh apoia duas cooperativas de catadores onde tem fábricas: em Alagoinhas, na Bahia, e em Manaus, no Amazonas, onde existe a maior produção de tampinhas de alumínio do país. Estas duas cooperativas são lideradas por mulheres de origem negra e indígena. Elas superaram infinitas barreiras, como o trabalho braçal pesado, o preconceito, o assédio para estarem hoje na liderança de tantas pessoas. São elas que mantêm tantos cooperados unidos.
Ecoa: O que você aprendeu com ela?
Elisangela Matos: Ela costuma dizer: “Calce primeiro os meus sapatos para me julgar”. Isso significa que em uma gestão é preciso ter escuta ativa, empatia. Dona Rosa também sempre repete que liderar não significa ordenar. O essencial, segundo ela, é a cooperação. Isso, no fim, é o que mais se ensina nas universidades. Observar esta mulher me traz também um pouco da minha própria história.
Ecoa: Por quê?
Elisangela Matos: Dona Rosa me lembra minha mãe e avó, que também nasceram na Bahia, são mulheres negras, e que lutaram para que eu jamais caísse na invisibilidade, incentivando uma formação universitária sólida, por exemplo. Minha mãe também estudou e hoje é pós-doutora. Estas mulheres como minha mãe, avó, e Dona Rosa, são lideranças sustentáveis que transformaram a realidade das pessoas ao seu redor.
Ecoa: Esta visão de transformação da realidade tem a ver com o S do ESG.
Elisangela Matos: Com certeza. O S é a letra mais difícil porque estamos falando de pessoas e é preciso estar conectada a elas para que uma iniciativa tenha impacto.
Ecoa: Qual é seu principal desafio no momento?
Elisangela Matos: Quero trazer mais mulheres para o topo. Eu olho para os lados em congressos e não vejo meus pares. Portanto, meu objetivo agora é fazer com que mais Elisangelas estejam no mesmo lugar que estou.
Fonte: Coluna Mariana Sgarioni no Ecoa/UOL