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Julgamento no STF da revisão da vida toda deve recomeçar do zero

Ministro Nunes Marques pediu para processo ser retirado do plenário virtual e ser analisado no plenário físico

Um pedido de destaque feito pelo ministro Kassio Nunes Marques a menos de 30 minutos do prazo final do julgamento da revisão da vida toda deve fazer com que a decisão sobre o tema recomece do zero no STF (Supremo Tribunal Federal).

Com a solicitação, o processo deverá sair do plenário virtual para julgado no plenário físico. Não há data para uma nova votação do tema 1.102, que tem repercussão geral. A decisão tomada pelos ministros valerá para todas as ações do tipo em andamento no país.

A revisão da vida toda é uma ação judicial na qual os segurados pedem que todas as suas contribuições ao INSS, incluindo as realizadas antes da criação do real, em 1994, sejam consideradas no cálculo da média salarial para aumentar a renda previdenciária. No plenário virtual, o julgamento estava favorável aos aposentados. Seis dos 11 ministros haviam se mostrado a favor ao pedido de revisão, indicando a constitucionalidade da tese. Cinco deles foram contrários à correção, após relatório do governo indicar que haveria gastos de R$ 46 bilhões em dez anos se a medida fosse aprovada.

Com o pedido de Nunes Marques, poderá haver uma reviravolta no caso. O motivo é que um dos ministros favoráveis, o relator da medida, Marco Aurélio, está aposentado e não poderá votar. Além de Marques, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) para a vaga, e contrário ao tema, André Mendonça, que entrou no lugar de Marco Aurélio e é muito próximo à primeira-dama Michelle Bolsonaro, também foi indicado por Bolsonaro e, na opinião de especialistas, pode votar contra a revisão.

O julgamento do caso havia começado em junho do ano passado e foi interrompido após pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes. Na época, o placar estava empatado em 5 a 5. No dia 25 de fevereiro deste ano, a votação recomeçou. Logo nas primeiras horas, Moraes publicou seu voto e já foi possível saber sua decisão.

Assim como Marco Aurélio, relator do caso, Edson Fachin, Cármen Lúcia, Rosa Weber e Ricardo Lewndowski, o ministro também foi favorável à revisão. Em seu voto, além de garantir o direito ao melhor benefício, ele definiu quem poderia fazer o pedido.

“O segurado que implementou as condições para o benefício previdenciário após a vigência da lei 9.876, de 26/11/1999, e antes da vigência das novas regras constitucionais, introduzidas pela EC em 103/2019, que tornou a regra transitória definitiva, tem o direito de optar pela regra definitiva, acaso esta lhe seja mais favorável”, disse.

Em junho de 2021, foram contrários à decisão os ministros Nunes Marques, que abriu a divergência com base no relatório do governo, seguido por Dias Toffoli, Roberto Barroso, Gilmar Mendes e Luiz Fux.

Decisão pode corrigir erro da reforma de 1999

Para especialistas em previdência, a decisão a ser tomada no processo pode corrigir erro da reforma de 1999, que trouxe prejuízo a alguns segurados já inscritos na Previdência. A regra de transição aplicava duas fórmulas para apuração da média salarial utilizada no cálculo dos benefícios.

Pela nova lei, quem já era segurado do INSS até 26 de novembro de 1999 teria sua média salarial calculada sobre as 80% maiores contribuições realizadas a partir de julho de 1994.

Já para os trabalhadores que iniciassem suas contribuições a partir de 27 de novembro de 1999, a regra permanente estabeleceu que a média salarial seria calculada com os maiores salários de todo o período de contribuição. A correção do benefício na Justiça pode render atrasados de mais de R$ 100 mil.

Quem já contribuía com a Previdência e tinha salário mais alto antes do Plano Real pode ter sido prejudicado ao se aposentar depois da lei. O motivo é que os valores maiores ficaram de fora da conta do INSS para conceder o benefício. Na Justiça, os segurados tentam corrigir o prejuízo.

Esse é o caso do aposentado Carlos Eduardo Robba, 70 anos. Ele começou a trabalhar com 18 anos e, segundo sua família, está na ativa até hoje. Pediu o benefício por idade ao INSS aos 65 anos e, mesmo depois de trabalhar por 47 anos seguidos, o valor da aposentadoria que recebe é de um salário mínimo, hoje em R$ 1.212.

“Ele recebe somente um salário mínimo. Com a revisão, a aposentadoria vai triplicar. Já ganhamos parte do processo na Justiça”, conta sua mulher, Maria Cristina Robba, 67. Ao pedir o benefício, 25 anos de trabalho entre 1969 e 1994 ficaram de fora do cálculo da Previdência, período em que o aposentado trabalhou em boa parte do tempo com carteira assinada.

Depois, quando passou a ser autônomo e tocar a própria empresa, houve momentos em que não conseguia pagar as contribuições à Previdência e outros nos quais contribuía com valores baixos. “Foram anos muito difíceis, de crise”, diz ela.

A aposentada Tânia Cristina Garcia Lopes Bernucci, 62, também busca corrigir distorções no valor de seu benefício. Hoje, a renda de R$ 2.500 mensais que ganha da Previdência não é suficiente para pagar suas contas. “A sorte é que eu tenho marido, que está segurando a onda, e filho, que também está trabalhando”, diz ela.

Segundo seu processo, que está parado à espera da decisão do Supremo, o valor da aposentadoria deve subir para R$ 4.000. Ela, que trabalhou dos 18 aos 49 anos, quando se aposentou, se diz confiante. “A gente está vivendo cenário horroroso, de guerra, tristeza, dor, de situação interna ruim do país, que achei que houve sensibilidade quando ele [Alexandre de Moraes] se mostrou favorável”, afirma.

Próximos passos

Com o pedido de destaque, o julgamento volta à estaca zero e deve receber um novo relator, por meio de sorteio no sistema eletrônico do STF, dizem especialistas. Segundo a advogada Priscila Arraes Reino, do escritório Arraes & Centeno Advocacia, agora, o processo vai para o presidente do STF agendar nova data para julgamento em plenário presencial.

João Badari, sócio do Aith, Badari e Luchin Advogados, classifica o pedido de destaque como “atípico”. “Isso é muito atípico. Acho que vai sortear tudo de novo, que o processo realmente recomeça”, afirma.

Reforma de 2019 limitou a revisão

Tem direito à revisão o segurado que se aposentou nos últimos dez anos, desde que seja antes da reforma da Previdência, instituída pela emenda 103, em 13 de novembro de 2019. É preciso, ainda, que o benefício tenha sido concedido com base nas regras da lei 9.876, de 1999.

A correção compensa, no entanto, para quem tinha altos salários antes do início do Plano Real. Trabalhadores que ganhavam menos não terão vantagem. Se incluírem as remunerações antigas, de baixo valor, poderão diminuir a aposentadoria que recebem hoje.

O advogado Roberto de Carvalho Santos, do Ieprev (Instituto de Estudos Previdenciários), diz que o prazo de dez anos, chamado de decadência, é um limitador aos segurados. “É preciso partir da premissa de que não se passaram dez anos, porque o entendimento consolidado da jurisprudência é de que depois de dez anos não cabe a revisão da vida toda.”

Priscila afirma que há direito ao pagamento dos valores atrasados limitados aos últimos cinco anos antes do pedido de correção, o que faz com que o valor a ser recebido não seja tão alto na maioria dos casos.

Fonte: Folha de São Paulo

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