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MPF intima Caixa a explicar destino de poupança de pessoas escravizadas

Sede da Caixa Econômica Federal
Sede da Caixa Econômica FederalImagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O MPF (Ministério Público Federal) intimou a Caixa Econômica Federal a se explicar sobre o acervo histórico que guarda as cadernetas de poupança de pessoas escravizadas no século 19. A determinação ocorreu após uma reunião realizada em 15 de agosto entre a Caixa, o MPF e o movimento Quilombo Raça e Classe.

O que aconteceu

Caixa deve enviar resposta ao MPF até 15 de setembro. A investigação teve início após ação do movimento Quilombo Raça e Classe.

Para o movimento, é necessário compreender que o Estado brasileiro cooperou com o sistema escravagista. Segundo Cláudio Donizete, um dos representantes do movimento na reunião, o Estado e as instituições econômicas, como o Banco do Brasil e a Caixa, cooperaram com a escravidão por meio do financiamento do tráfico e da coleta de recursos de escravizados por meio da poupança.

A Caixa foi criada em 1861, dez anos antes da lei do Ventre Livre. A lei permitiu que pessoas escravizadas pudessem ter poupança. Com o dinheiro, elas poderiam comprar a alforria, que concedia a liberdade. A abolição da escravidão no país só ocorreria em 1888.

Mesmo com abolição, contradição jurídica fez com que poupança de escravizados ficasse retida, afirmou integrante do movimento. Maristela Farias diz que os valores ficaram sob a tutela de terceiros, sem previsão de reparação.

Há registros de contas correntes não movimentadas, disse a professora Keila Grinberg, outra representante do movimento. Ela assinalou que o acervo não está totalmente organizado e que existem registros de contas correntes não movimentadas, distintas das cadernetas de poupança. Indicou que, somente com pleno acesso ao acervo, será possível verificar quais contas foram movimentadas.

Representantes da Caixa disseram que é incorreta a premissa de que valores não movimentados estejam sob posse da Caixa. O diretor jurídico do banco, Carlos Jenier, também afirmou que a instituição preserva documentos relacionados à história escravista.

Acervo é acessível apenas para pesquisas científicas, e sua catalogação e restauração demandaria duas décadas. Na reunião, o gerente executivo do banco, André Viviani, afirmou que a Caixa abriga 15 mil metros lineares de documentos.

Procurador defendeu que é necessário apurar o que aconteceu com as poupanças. Segundo Julio Araujo, é necessário compreender a memória histórica do processo.

O que diz a Caixa

A Caixa esclarece que, desde a fundação do banco, em 1861, a instituição tem um papel fundamental nas transformações sociais do país; é reconhecida por sua disposição para as questões sociais; e participa da vida de todas as camadas da população brasileira, em especial daquelas mais desassistidas.

Antes mesmo da Lei do Ventre Livre (1871), a Caixa já permitia a abertura de poupança para compra da carta de alforria pelas pessoas escravizadas.

As cadernetas mantidas nas unidades da Caixa Cultural são preservadas por equipes multidisciplinares e orientam-se à memória da instituição e do povo brasileiro.

A documentação do Acervo Cauxa não identifica, em pesquisas feitas até o momento, alguma conta de escravizado que tenha sido sacada pelo seu senhor após a abolição. Alguns registros já pesquisados apontam que os titulares continuavam a movimentar as suas contas após a abolição, em 1888, como por exemplo a conta nº 430 pertencente ao escravo Ismael, natural da província de Mato Grosso, que em janeiro de 1889 fez a ‘retirada por saldo’ de valores de sua conta”,
Caixa Econômica Federal, sobre a intimação do MPF.