Insegurança alimentar no Brasil quase dobra, dizem entidades internacionais
O principal levantamento internacional sobre a fome no mundo revela que a crise alimentar voltou a abalar de forma significativa o Brasil nos últimos dois anos.
Dados publicados nesta segunda-feira revelam que, entre 2018 e 2020, a prevalência de insegurança alimentar grave atingiu 7,5 milhões de brasileiros. No período entre 2014 e 2016, esse número era de 3,9 milhões de brasileiros.
Se a conta incluir a prevalência de insegurança alimentar moderada ou grave, já são 49,6 milhões de brasileiros impactados. Em 2014, eram 37,5 milhões de pessoas.
Segundo o informe, houve um agravamento dramático da fome no mundo em 2020, provavelmente relacionado com as consequências da pandemia.
De acordo com a FAO, insegurança alimentar se refere ao acesso limitado de uma pessoa ou de uma residência à comida, seja por falta de dinheiro ou outros recursos.
As entidades estimam que uma pessoa que passe um dia inteiro sem acesso à comida deve ser classificada como fazendo parte do grupo que vive uma “insegurança alimentar grave”.
Não se trata, porém, da classificação de fome aguda, índice que é usado quando o acesso aos alimentos é dificultado de maneira crônica.
Em 2014, 12,1 milhões de brasileiros estavam subnutridos. Para 2020, o Brasil foi o único país da América do Sul a não fornecer números oficiais para as entidades.
Para as entidades, a pandemia está intimamente relacionada com a alta. A América Latina, inclusive, foi a região do mundo que viu o maior salto em pessoas vivendo em “insegurança alimentar”. No mundo, a taxa aumentou de 22% para 26% entre 2014 e 2019. Mas, em 2020, o salto foi ainda maior, chegando a 30’%.
Hoje, um décimo da população mundial – até 811 milhões de pessoas – está subnutrido. O número sugere que será necessário um tremendo esforço para que o mundo honre sua promessa de acabar com a fome até 2030.
O relatório é publicado conjuntamente pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), o Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (IFAD), o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), o Programa Mundial de Alimentação (PMA) e a Organização Mundial da Saúde (OMS).
As edições anteriores já haviam colocado em evidência que a segurança alimentar de milhões estava em jogo. “Infelizmente, a pandemia continua a expor fraquezas em nossos sistemas alimentares, que ameaçam a vida e a subsistência de pessoas ao redor do mundo”, escrevem os chefes das cinco agências da ONU.
Eles continuam alertando para um “momento crítico”, mesmo quando depositam novas esperanças no aumento da dinâmica diplomática. “Este ano oferece uma oportunidade única para avançar na segurança alimentar e nutrição através da transformação dos sistemas alimentares com a próxima Cúpula das Nações Unidas sobre Sistemas Alimentares, a Cúpula sobre Nutrição para o Crescimento e a COP26 sobre mudanças climáticas”.
Os números em detalhe
Em 2020, a fome aumentou tanto em termos absolutos quanto proporcionais, ultrapassando o crescimento populacional. Estima-se que cerca de 9,9% de todas as pessoas estavam subnutridas no ano passado, contra 8,4% em 2019.
Mais da metade de todas as pessoas subnutridas (418 milhões) vive na Ásia; mais de um terço (282 milhões) na África; e uma proporção menor (60 milhões) na América Latina e no Caribe.
Mas o aumento mais acentuado da fome ocorreu na África, onde a prevalência estimada da subnutrição – de 21% da população – é mais que o dobro da de qualquer outra região.
Em outras medidas também, o ano de 2020 foi sombrio. No total, mais de 2,3 bilhões de pessoas (ou 30% da população mundial) não tiveram acesso a alimentos adequados durante todo o ano: este indicador – conhecido como prevalência de insegurança alimentar moderada ou grave – saltou em um ano tanto quanto os cinco anteriores combinados.
A desigualdade de gênero se aprofundou. Para cada 10 homens com insegurança alimentar, havia 11 mulheres com insegurança alimentar em 2020 (acima dos 10,6 em 2019).
A desnutrição persistiu em todas as suas formas, com as crianças pagando um preço alto: em 2020, estima-se que mais de 149 milhões de menores de cinco anos foram raquíticas, ou muito pequenas para sua idade; mais de 45 milhões – desperdiçadas, ou muito magras para sua altura; e quase 39 milhões – acima do peso.
Um total de três bilhões de adultos e crianças permaneceram distante de dietas saudáveis, em grande parte devido a custos excessivos. Quase um terço das mulheres em idade reprodutiva sofre de anemia. Globalmente, o mundo não está no caminho certo para atingir as metas de quaisquer indicadores nutricionais até 2030.
Fonte: UOL/Coluna Jamil Chade