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Por que Campinas foi para fase laranja com 86,13% dos leitos de UTI para Covid ocupados?

Por Juliana Jodas

Na última sexta-feira, dia 24 de julho, o prefeito de Campinas, Jonas Donizette (PSB) anunciou o retorno da cidade para a fase laranja e, a partir deste novo quadro, a reabertura do comércio. Segundo decreto 20.901 o comércio de rua e os shoppings poderão voltar a funcionar a partir de segunda-feira dia 27 de julho em horários reduzidos.

(foto carlos bassan – pmc – dp)

No entanto, segundo o boletim epidemiológico do próprio dia 24 de julho, Campinas confirmava pela manhã mais 15 mortes e um aumento de 667 casos de pessoas infectadas no intervalo de um dia, totalizando 15.629 casos registrados positivos da Covid-19 e 667 mortes confirmadas. Além disso, segundo o site da prefeitura de Campinas1, a taxa de ocupação de leitos da UTI para pacientes com Covid-19 (tanto nas redes públicas quanto particulares) corresponde a 86,13%. O SUS Municipal tem uma taxa de ocupação de 94,19% dos leitos com apenas 9 livres, o SUS Estadual tem 87,10% dos leitos ocupados, com 12 livres e os leitos particulares tem uma taxa de 77,91% ocupados e 36 livres.

Quais os critérios para calcular as fases de cada município?

O chamado Plano de São Paulo, estabelecido pelo Decreto nº 64.994 em 28/05/2020 para todos os municípios do estado de São Paulo, tem como objetivo o retorno das atividades com segurança durante a pandemia do novo coronavírus. Para isso, ficou determinado 5 fases, sendo a primeira a fase vermelha, de alerta máximo, para situações com alto índice de contaminação e abertura apenas para serviços essenciais, e a quinta e última a fase azul, a normal controlada, fase de controle da doença e liberação de todas as atividades com protocolos de segurança.

(imagem – gov -sp)

Para evoluir de fase o Plano prevê dois principais critérios: o primeiro é a capacidade do sistema de saúde, isso significa a proporção de leitos de UTI para Covi-19 a cada 100 mil habitantes e a taxa de ocupação. O segundo critério é a evolução da epidemia segundo o número de casos, de internações e de óbitos. Seguindo esses critérios, a mudança de fase só pode ocorrer após 14 dias, com a manutenção dos indicadores de saúde estáveis. No caso de retrocesso de fase, não é necessário aguardar os 14 dias.

Analisando o município de Campinas, conforme mencionado, a taxa de ocupação dos leitos de UTI para Covid-19, segundo o último dia 24/07/2020 é de 86,13% e o número de casos de coronavírus na cidade teve um aumento de 144% no período de um mês, ou seja, passando de 6.415 casos para 15.629 e mais que dobrando o número de mortes.

O que os dados expressam é que o município não cumpre com nenhum dos critérios estabelecimento para o avanço de fase de acordo com o Plano de São Paulo.

Para que Campinas apresentasse indicativos compatíveis com a fase laranja, os dados utilizados foram do Departamento Regional de Saúde, o DRS-VII que corresponde a 42 municípios, entre eles cidades que já estavam na fase laranja. De acordo com os dados da região de Campinas (e não do município) a taxa de ocupação de leitos da UTI para Covid-19 passa a ser 78,3%, o que permitiu a progressão para a fase laranja.

Pressão ao poder público

Na última quinta-feira, 23 de julho, comerciantes e empresários dos setores de bares, restaurantes, beleza e hotelaria realizaram um protesto em frente a prefeitura, pressionando o poder público pela reabertura dos estabelecimentos não essenciais, fechados devido a fase vermelha do município de alerta a epidemia do novo coronavírus.

A pressão ao poder público é bastante compreensível já que a resposta às micro e pequenas empresas dadas pelo governo foram praticamente nulas e pouco eficazes. O governo federal estabeleceu o Pese (Programa Emergencial de Suporte a Empregos) para auxiliar na folha de pagamento e evitar demissões e o Pronampe (Programa Nacional de Apoio às Microempresas), uma linha de crédito para ampliar o capital de giro.

Ambas medidas estão longe de terem impacto e efetividade para as pequenas empresas: segundo dados do IBGE2, até a primeira quinzena de junho de 2020, mais de 716 mil empresas fecharam e o alcance do Pronampe, por exemplo, ainda é muito baixo. Cabe ressaltar que uma empresa não tem apenas a folha de pagamento enquanto urgência, mas contas de aluguel, energias e outras que se somam enquanto empecilho para que apenas um dos programas consiga resolver a situação econômica.

A incerteza sobre a duração da pandemia e a falta de ações concretas para que setores que não são considerados atividades essenciais tenham respaldo econômico, corroboram para o entendimento perverso do retorno das atividades econômicos em meio a uma situação de alerta e de aumento exponencial de casos de Covid-19 na cidade de Campinas.

É preciso pressionar para que se tenham medidas de respaldo econômicas mais efetivas para as micro-empresas e pequenos comerciantes, via governo municipal, estadual e federal, para que esse setor não precise se expor (e consequentemente expor à população que amplia sua circulação) enquanto a pandemia atinge seu pico de contaminação na cidade.

Assegurar a quarentena enquanto proteção e segurança para a população é criar políticas que contemplem a sobrevivência de pequenos comerciantes, seja por meio de anistia de contas básicas, como luz e água, durante este período, seja por através de linhas de crédito ou de auxílio emergencial direto. Exigir a reabertura do comércio sem qualquer controle sanitário e com a taxa de ocupação de leitos de UTI superior a 80% é uma lógica perversa de responsabilização e saídas individuais pela crise instaurada em virtude da pandemia e a ineficácia de atuação dos governos.

O avanço da cidade de Campinas para a fase laranja não corresponde a um controle e maior segurança dos números de casos de Covid-19 e de medidas de proteção, inclusive houve a liberação para a abertura de templos religiosos, contrária a liminar do TJ-SP.

Em tempos de pandemia, se tornou fala comum o termo necropolítica, cunhado pelo filósofo Achille Mbembe, a partir de uma releitura do conceito foucautiano de biopolítica, para entender a morte enquanto insignificância e aniquilação de grupos de pessoas na contemporaneidade. Pautado nesse ensaio, sobre a política enquanto uma forma de guerra em que se exerce o poder de matar, deixar viver ou expor à morte, colocamos a indagação sobre as responsabilidades das decisões políticas do governo frente à pandemia e as vidas da população atravessadas por essas escolhas.

1 Ver em: http://www.campinas.sp.gov.br/noticias-integra.php?id=39059

2 Fonte: https://covid19.ibge.gov.br/pulso-empresa/

Fonte: Carta Campinas

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