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“Negociado sobre o legislado” desmantelou o Direito do Trabalho

Entenda o impacto do negociado sobre o legislado na reforma trabalhista de 2017 e suas consequências para a proteção legal.

O negociado sobre o legislado fragilização da proteção legal dos trabalhadores.

Ao completar 8 anos, a Lei 13.467 — a “reforma” trabalhista de 2017 — revela, em seu cerne, a prevalência do negociado sobre o legislado como mecanismo de precarização e fragilização da proteção legal.

*Por Marcos Verlaine

A Lei 13.467/17, número da chamada Reforma Trabalhista, alterou profundamente a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) ao inserir o artigo 611-A, que autoriza que acordos e convenções coletivas — “o negociado” — prevaleçam sobre dispositivos da lei — “o legislado” — em diversos temas.

Para o MPT (Ministério Público do Trabalho), essa alteração não era apenas técnica, mas visava “permitir a exclusão de direitos trabalhistas pela via negocial”.

O negociado sobre o legislado sempre existiu com a CLT. Todavia, as negociações eram realizadas para superar a legislação trabalhista e, sobretudo, sob a proteção dessa baliza legal.

Promessa de modernização, resultado de fragilidade

A justificativa oficial da contrarreforma foi que tal prevalência elevaria a negociação coletiva e geraria empregos.

Mas, oito anos após sua vigência — desde novembro de 2017 —, os resultados mostram outra realidade: fragilização sindical, insegurança jurídica e condições de trabalho mais vulneráveis.

O próprio MPT advertiu que a flexibilização — como a prevalência do negociado sobre o legislado — contraria convenções internacionais assinadas pelo Brasil e pode enfraquecer a negociação coletiva no longo prazo.

Negociado sobre o legislado em prática

Na prática, o negociado sobre o legislado aplicou-se a diversos pontos:

  • jornada,
  • banco de horas,
  • plano de cargos e salários,
  • intervalo intrajornada,
  • trabalho remoto, entre outros.

Entretanto, em um contexto de desemprego elevado e sindicatos fragilizados, o “negociado” não funcionou como instrumento para fortalecer os trabalhadores, mas como via de redução de direitos e precarização.

Resultado medido e críticas fundamentais

O emprego formal não disparou com a reforma: os principais resultados promissores não se concretizaram em termos de geração de vagas com qualidade.

A economia gerada para as empresas e o Estado — aproximadamente R$ 15 bilhões entre 2022 e 2024, segundo estudos — contrasta com o enfraquecimento dos trabalhadores.

O ambiente normativo mudou, mas o mercado de trabalho continua marcado por informalidade, alta rotatividade, jornadas exaustivas e baixos salários.

Patrões mais fortes, trabalhadores mais fracos

O princípio da prevalência do negociado sobre o legislado deveria simbolizar autonomia e fortalecimento da negociação coletiva.

Na prática, serviu como instrumento de transferência de poder para o empregador, em uma relação estruturalmente desigual.

O Estado, por meio da “reforma”, mitiga sua função protetiva e regula pela omissão.

Hoje, ao completar oito anos da Lei 13.467/17, cabe perguntar: a quem serviu essa mudança?

Se o trabalhador não negociava em pé de igualdade antes, agora enfrenta cláusulas que podem reduzir direitos previamente garantidos. E a negociação coletiva, tal como pensada na Constituição, de fato ampliou a proteção ou virou via para a retirada de direitos?

Piso mínimo de proteção

O Brasil precisa resgatar a ideia de que o legislado deve ser o piso mínimo de proteção — e que o negociado somente pode elevar, não reduzir ou suprimir direitos.

Mais que isso: impõe-se o movimento de reconstrução do Direito do Trabalho, para que o papel do Estado, dos sindicatos e dos instrumentos de negociação recupere a função social de equilíbrio entre capital e trabalho.

*Marcos Verlaine é jornalista, analista político e assessor parlamentar do Diap.

Fonte: Rádio Peão Brasil