Denúncias de assédio são acobertadas desde 2019, afirma ex-funcionária da Caixa
Primeiros casos de assédio sexual e moral surgiram e foram acobertados ainda no primeiro ano em que Pedro Guimarães assumiu a presidência da Caixa
O presidente Jair Bolsonaro (PL) evitou responder, ontem (4), sobre as denúncias de assédio sexual e moral de servidores da Caixa Econômica Federal contra o agora ex-presidente do banco público Pedro Guimarães. Provocado a comentar o escândalo por um apoiador no cercadinho do Palácio da Alvorada, Bolsonaro limitou-se a dizer que o executivo “foi afastado”. “Tá respondido?”, questionou, logo em seguida se corrigindo. “Ou melhor, ele pediu afastamento, tá?”, completou o mandatário.
Desde que o caso veio à tona, em reportagem do portal Metrópoles, há exatamente uma semana, essa foi a primeira vez que Bolsonaro falou sobre o tema. O presidente da República não comentou, porém, o teor das acusações. O que desapontou quem esperava uma palavra de censura do chefe do Executivo. A postura de Bolsonaro, no entanto, não surpreendeu a consultora jurídica aposentada da Caixa Isabel Gomes, que denuncia que os primeiros casos referentes ao comportamento de Pedro Guimarães, na verdade, foram acobertados ainda em 2019, ano em que ele assumiu a presidência do banco, após indicação de Bolsonaro, de quem passou a ser amigo e um dos principais homens de confiança.
É o que destaca em entrevista a Glauco Faria, do Jornal Brasil Atual. “Assim que ele (Pedro Guimarães) assumiu começaram boatos sobre o comportamento dele em vários campos. Mas o destaque foi essa questão do assédio sexual”, relata Isabel.
Assédio judicial
De acordo com a advogada, tornou-se público um episódio em que um vigilante tinha visto um carro trepidar na garagem do estacionamento da Caixa. Ao averiguar, o funcionário encontrou dentro do veículo o então presidente da Caixa em ato sexual com uma colega, conforme também descreveu em reportagem do site da revista CartaCapital. O caso chegou em forma de denúncia ao marido de Isabel, o ex-presidente da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa (Fenae) e também aposentado Pedro Eugênio Beneduzzi.
Beneduzzi, que usava as redes sociais para acusar o presidente do banco estatal de ser dono de outra instituição financeira e de atuar para enfraquecer os serviços públicos da Caixa, passou também a chamá-lo de “Pedro da Garagem” nas manifestações. Segundo Isabel, essa referência fez com que o presidente da Caixa movesse uma ação judicial contra seu companheiro, acusando-o de injúria e pedindo uma reparação de R$ 200 mil. Guimarães também conseguiu uma liminar que impedia o sindicalista de comentar o assunto.
A ação correu em segredo de justiça, sem que seu marido pudesse ao menos comentar que estava sendo processado. Beneduzzi acabou, depois de dois anos, aceitando um acordo judicial para por fim ao processo. Isso porque na época “o clima de terror era tanto dentro da matriz (em Brasília) e de toda a Caixa que não houve repercussão ou acréscimo de denúncias (contra o presidente do banco) que pudesse fortalecer (a denúncia do marido)”, explica a advogada.
Ouvidoria desmontada
“Logo em seguida ele (Beneduzzi) veio a falecer no âmbito da pandemia e ficou o dito pelo não dito. Mas assim, houve um momento em que era possível ter feito essa averiguações e investigações. E isso não teria permitido que o fato tomasse essas proporções aterradoras que atingiram dezenas, e talvez centenas, de colegas. Até porque o comportamento de um dirigente máximo de uma instituição acaba inspirando e influenciando as esferas inferiores. Então hoje o que se diz é que há assédio inclusive nas instâncias inferiores, chegando nas agências”, lamenta Isabel.
Hoje consultora jurídica aposentada da Caixa, Isabel também foi criadora da ouvidoria da empresa, em 2002. Ela chegou a ocupar o cargo de ouvidora por cinco anos, após o órgão ser oficialmente solidificado em 2003, no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). De acordo com ela, sempre teve denúncias de assédio sexual e moral. “Mas nunca de nível tão rasteiro e na presidência”, conforme descreve.
Ainda segundo a advogada, a ouvidoria, desde 2016, está desmontada e os empregados não se sentem mais representadas ou à vontade para fazer uma denúncia. No caso das recentes acusações de assédio sexual, elas só ganharam visibilidade após denúncias das funcionárias ao Ministério Público Federal (MPF) que, desde o ano passado, investiga o caso sob sigilo. Mas as acusações chegaram a ser ignoradas pelos sistemas de ouvidoria da Caixa. E há denúncias de servidoras que foram perseguidas e até removidas de suas funções. “Nos bastidores em que todo mundo sabe que as denúncias não eram apuradas. E que Pedro Guimarães tinha até intermediários para que as denúncias não fossem apuradas. Assim chegamos a esse fato que é aterrador, chocante e suja o nome de uma empresa que é centenária”, critica Isabel.
Fonte: Rede Brasil Atual