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Desperdício de água é o triplo do razoável em 40 das 100 maiores cidades do país

Estudo do Trata Brasil aponta que saneamento está longe da universalização

Em época de escassez hídrica, levantamento inédito do Instituto Trata Brasil aponta que 40 das cem maiores cidades brasileiras desperdiçaram, em 2012, mais de 45% da água tratada. E vai além: entre 2011 e 2012, 90% dos municípios apresentaram evolução nula ou menor que 10%. Segundo o Ministério das Cidades, que reúne os dados do setor, a média brasileira de perdas de água — que inclui desde vazamentos até gatos e falha ou falta de medição — é de 36,9%. Especialistas, no entanto, dizem que o razoável seria até 15%.

— É inadmissível e esse resultado tem que ser encarado com austeridade. É necessário um esforço para reduzir as perdas. Por exemplo, o que o Rio Guandu desperdiça, cerca de 40% de 50m³ por segundo, daria para evitar alguns problemas que a seca traz, e bastava reduzir em 50% esta perda — explica Paulo Canedo, coordenador do laboratório de Hidrologia da Coppe/UFRJ.

Publicado desde 2007, o Ranking do Saneamento Básico nas 100 Maiores Cidades utiliza dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) 2012 e apresenta os avanços e os desafios em água e esgoto nesses municípios.

— O estudo mostra que os maiores avanços estão nas cidades que já estavam bem. Para se ter um ideia, o governo federal investe em média R$ 9,7 bilhões por ano. Mas R$ 6,3 bilhões estão em cinco estados: Rio, São Paulo, Minas, Bahia e Rio Grande do Sul. O que sobra é para os outros e o DF — explica Édison Carlos, presidente-executivo do Trata Brasil: — No país, saneamento ainda anda muito devagar.

Vazamentos constantes
Morador de Recife, que no levantamento aparece como uma das cidades com maior desperdício de água — 62,03% de perdas de faturamento e 59,85%, na distribuição —, o estudante Benjamim Alves Neto, de 22 anos, convive com um vazamento de água na Rua Roberto Silveira.

— É constante esse desperdício. Em setembro de 2013, a Compesa (Companhia Pernambucana de Saneamento) veio e fez o serviço, mas meses depois continua vazando. E o fornecimento é dia sim, dia não.

Em Jaboatão dos Guararapes, na Região Metropolitana do Recife, que apresenta mais de 60% de perda e em 2012 tinha pouco mais da metade da população — 55,29% — com atendimento de água, José Ailton do Nascimento, de 47 anos, trabalha em frente a um vazamento que se mistura com o esgoto no bairro Piedade.

— O cheiro é insuportável em alguns momentos. Eu e meus vizinhos já procuramos a Compesa e temos vários protocolos de atendimento. Os funcionários até vieram, mas disseram que não possuem os equipamentos corretos para os reparos — diz Nascimento, lembrando que o problema já se arrasta por um ano.

Em relação ao tratamento de esgoto, o Trata Brasil mostra que, em 2012, menos de 20% da população de 28 municípios tinham acesso ao serviço. Belém, Cuiabá e Porto Velho são as capitais que se enquadram nessa categoria. Cidades da Baixada Fluminense, no Rio, Nova Iguaçu e São João de Meriti tratavam 0,4% e 0%, respectivamente.

Na coleta, 80% dos habitantes de 39 cidades contam com o serviço, mas capitais como Teresina, Porto Velho, Belém e Macapá estão entre as que o acesso é para menos de 20% da população.

— Esses números podem estar acima do real. Entendem como coleta ter o cano na rua. Mas ter o cano não significa que existe coleta. O ideal era termos indicadores verdadeiros, que mostrassem o que funciona, e que cada cidade, cada Região Metropolitana tivesse metas a cumprir — diz Canedo.

Meta distante
O Trata Brasil também apontou nesta edição quantas das 20 piores cidades entre as cem analisadas serão capazes de universalizar o saneamento em 2033, meta estabelecida pelo governo federal. Segundo o estudo, apenas Manaus cumpriria a meta. As outras 19, incluindo capitais como Natal, Macapá, Belém, Teresina e Porto Velho, se mantiverem a média em coleta/tratamento de esgoto de 2008 a 2012, não atingirão a universalização.

— Não é só falta de recurso que não faz avançar, é falta de projeto. Os investimentos têm sido feitos, mas não no ritmo que o Brasil precisa — diz Édison Carlos, que defende que o governo federal deixe de repassar recursos se as metas não forem cumpridas pelos prefeitos e governadores: — A maior parte das autoridades sabe que saneamento é importante, mas muitas vezes valoriza o que é visível. Quando o PAC 1 for finalizado, daremos um salto, mas ainda há lentidão. E o PAC 2, em dezembro de 2013, ainda tinha a maior parte das obras paradas.

De acordo com o Ministério das Cidades, “no último triênio (entre 2011 e 2013) foram desembolsados R$ 25,5 bilhões em iniciativas de saneamento, equivalentes a valores médios de R$ 8,5 bilhões por ano. Em 2014, até o final do 1º semestre, já foram desembolsados R$ 4,3 bilhões”. O Ministério informa ainda que “o índice de coleta de esgotos com redes é de 48,3% e que o índice de tratamento dos esgotos avançou de 37,5% em 2011 para 38,7%, em 2012. Sobre as perdas de água, “de 2006 a 2012, o índice passou de 43,8% para 36,9%“.

Procurada pela reportagem, a Compesa não respondeu até o fechamento desta edição.

Fonte: O Globo

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