Estudo mostra baixo efeito do desconto no IPI de veículos sobre PIB e emprego
A redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para automóveis teve impacto positivo, mas muito pequeno, sobre o Produto Interno Bruto (PIB) real e sobre o emprego na economia brasileira entre 2010 e 2013. Essa é uma das principais conclusões de um estudo recém-elaborado por dois economistas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Alexandre Porsse e Felipe Madruga.
Entre 2010 e 2013, a contribuição positiva da desoneração do IPI dos automóveis para o PIB foi de apenas 0,02% ao ano, e no emprego, de 0,04% ao ano. A interpretação no sentido oposto – o que ocorreria na ausência dessa política – é que o PIB e o emprego teriam redução de 0,02% e 0,04% ao ano, respectivamente, de 2010 a 2013, portanto um impacto limitado, segundo o estudo.
Porsse, professor da UFPR, e Madruga, doutorando na mesma universidade, se concentraram apenas no IPI sobre automóveis, porque representa mais da metade das desonerações de IPI feitas, sendo o mais relevante. Porsse diz que o pequeno efeito da redução do IPI de automóveis surpreende pela ênfase que ainda é dada pelo governo federal a essa política.
A análise, que parte de um modelo econométrico, tenta contribuir para a discussão sobre os efeitos de uma política industrial vertical (que elege alguns setores da indústria como prioritários para a política do governo) ou horizontal (na qual não há eleitos, mas a política abarca todos os setores da indústria), em um momento em que o governo federal tenta uma política industrial vertical e decide pela prorrogação do incentivo ao setor.
O IPI de automóveis estava previsto para voltar no dia 1º de julho para sua alíquota cheia (4% a 13%, dependendo do modelo), mas foi prorrogado e continuará entre 3% e 10% até dezembro.
“Se formos considerar hoje que o Brasil tem como principal gargalo para retomada do seu crescimento o desequilíbrio fiscal, o sinal que é passado com essa política de desoneração – embora se espere que ela estimule algum consumo – é que está sendo mantido o patamar de renúncia fiscal até o fim do ano”, diz Porsse.
“Para formação de expectativas, a manutenção dessa política sinaliza que uma deterioração das contas públicas tende a se manter durante mais algum tempo. Sua prorrogação pode mais comprometer do que estimular o crescimento”, afirma.
“Geralmente, quando têm foco setorial, as políticas de desoneração tributária são muito mais sensíveis a pressão de grupos, ao lobby, do que uma política de âmbito mais geral. Então, você tem uma certa resistência a retornar para os patamares anteriores das alíquotas”, argumenta Porsse, sobre desvantagens da manutenção dessa medida.
Os economistas também concluíram que um outro problema da medida foi se mostrar uma política tributária regressiva. Isso significa que a desoneração, implantada a partir de 2009 como medida anticíclica diante da crise de 2008, não beneficiou as pessoas mais vulneráveis, e sim atuou principalmente em favor das classes de renda mais altas.
De acordo com os pesquisadores, se houvesse a mesma desoneração dos automóveis para vários setores industriais, os ganhos econômicos para o país seriam similares (alta de 0,02% no PIB e de 0,04% no emprego). Porém, em relação aos efeitos distributivos, a política seria mais benéfica, porque o efeito distributivo tributário seria progressivo, beneficiando, portanto, especialmente as pessoas mais vulneráveis, com até um salário mínimo de renda.
Gabriel de Barros pesquisador do Ibre-FGV concorda com os poucos efeitos sobre PIB e emprego da desoneração do IPI para automóveis e também critica as prorrogações, dado o limite que esse tipo de medida já atingiu. “Ninguém vai comprar carro novo todo ano. Não adianta reduzir IPI sistematicamente para estimular o consumo”, disse, citando o comprometimento da renda de muitos consumidores que anteciparam compras usando financiamento para aproveitar o benefício da medida na ocasião de sua implantação.
Entre os que defendem a desoneração de IPI, o argumento é que ela ajuda na manutenção e ampliação de empregos, além de ter efeitos indiretos sobre o recolhimento de outros impostos.
Em janeiro deste ano, estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) apontou que, de 2009 a 2013, o governo abriu mão de R$ 6,1 bilhões de tributos devido à desoneração do IPI sobre automóveis. Mas, no mesmo período, houve incremento de arrecadação de R$ 11,8 bilhões de PIS e Cofins sobre a venda de automóveis e veículos leves.
Em 2009, um estudo do Ipea concluiu que a perda de arrecadação com IPI naquele ano (o primeiro ano de vigência da medida) foi compensada, em grande parte, com aumento de recolhimento de outros tributos, como a arrecadação da Cofins e PIS-Pasep sobre fabricação de veículos automotores. Em relação ao emprego na cadeia automobilística, o estudo concluiu que, mesmo com a desoneração, o emprego manteve tendência de redução ao longo do primeiro semestre de 2009.
Porrse destaca que, nos últimos anos principalmente, o impacto negativo da desoneração para a arrecadação do governo não tem sido coberto por esperados efeitos positivos do setor automobilístico sobre o restante da economia, a partir de um incremento da venda de veículos ou mesmo da produção, já que ambas têm se mostrado mais fracas.
“Essa postergação pode servir para um cenário de manutenção dos empregos até o fim do ano. No segundo semestre, tem eleições, então uma trajetória de demissões e de retração econômica no setor acabaria sendo ruim”, criticou o economista da UFPR.
Algumas montadoras demitiram recentemente funcionários e outras colocaram parte da sua força de trabalho em licença remunerada, por conta da alta dos estoques, mesmo com o incentivo de IPI em vigor.
O secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Márcio Holland, não comentou as conclusões do estudo. Defendeu, no entanto, que as políticas anticíclicas foram adotadas pelo governo em um período de crise internacional grave para mitigar os efeitos para a economia brasileira. Holland ressaltou ainda que a redução do IPI do setor automotivo, associada com outras medidas do governo, ajudaram o país a manter a taxa de desemprego em queda.
Além disso, afirmou Holland, desde 2011 até hoje, foram criados mais de cinco milhões de empregos com carteira assinada, mesmo num período de crise. O secretário acrescentou que as medidas anticiclícas ajudaram ainda no crescimento de 5,2% (número revisado do IBGE) da taxa de investimento do país no ano passado.
Nos últimos dias, foram divulgados dados desanimadores sobre o setor automobilístico e sobre a produção industrial. A menor produção de automóveis e caminhões foi uma das principais responsáveis para derrubar o resultado em maio da produção de bens de consumo duráveis e de bens de capital, segundo a pesquisa de Produção Industrial Mensal – Produção Física (PIM-PF). A Anfavea, entidade do setor automotivo, também revisou para baixo as expectativas sobre o desempenho da indústria automobilística em 2014. Na produção, o recuo deve ser de 10% e nas vendas é esperado recuo de 5,4%.
Fonte: Valor