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Presidenciáveis, empresas e trabalhadores querem nova lei para apps

Expressamente mencionada nos programas de governo dos três candidatos à Presidência mais bem posicionados nas pesquisas, a regulamentação do trabalho em aplicativos de transporte e de entrega é um dos principais temas das eleições de outubro.

Pelo menos 1,5 milhão de brasileiros — e eleitores — têm como fonte de renda a atividade em apps, segundo o Ipea (Instituto Nacional de Pesquisa Econômica Aplicada). Mas a maioria ainda se encontra na informalidade.

O plano do presidente Jair Bolsonaro para um novo mandato diz que “a estratégia de inclusão e combate à informalidade deverá contemplar alternativas contratuais inteligentes e que reconheçam a realidade desses trabalhadores”.

Líder nas pesquisas, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fala em seu programa que é necessário criar, “a partir de um amplo debate e negociação, uma nova legislação trabalhista de extensa proteção social”.

Já a carta de intenções de Ciro Gomes (PDT) destaca que é preciso regulamentar a atividade “estabelecendo patamares de higiene, segurança e de ganhos compatíveis com o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana”.

A Repórter Brasil elaborou um questionário sobre os principais pontos de uma eventual regulamentação do trabalho em apps. As perguntas foram respondidas por 13 entidades que representam motoristas e entregadores, nas cinco regiões do país.

O formulário também foi enviado às principais plataformas — só o iFood preencheu. Outros apps se posicionaram por meio de organizações empresariais, como o MID (Movimento Inovação Digital) e a Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia). Ambas não completaram o questionário, mas enviaram comentários à reportagem.

De acordo com as respostas, é necessário criar uma nova legislação para além da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e do Microempreendedor Individual (MEI).

Ainda segundo o questionário, aplicativos devem ser obrigados a contribuir para a Previdência, assim como motoristas e entregadores.

Além disso, a remuneração dos trabalhadores de apps precisa seguir regras mais claras, e os seguros oferecidos pelas plataformas devem ser mais acessíveis. Porém, determinar um limite de horas de trabalho por dia divide opiniões.

Confira abaixo os principais pontos do questionário.

CLT ou nova legislação?

A maioria dos que preencheram o questionário da Repórter Brasil (78%) afirma que é preciso construir uma nova lei porque “nem a CLT e nem outras formas são adequadas para regular o trabalho em aplicativos”.

No entanto, na opinião de Edgar da Silva – presidente da AMABR de São Paulo, associação de motofretistas – é preciso fazer uma ressalva. Quando aplicativos “tratam o entregador com características de vínculo empregatício”, determinando unilateralmente o pagamento e exigindo o cumprimento de jornadas mínimas, deveriam valer as regras da CLT, diz ele.

No entanto, se os entregadores tiverem o poder de discutir os valores das corridas e a liberdade de ligar o aplicativo quando quiserem, e se não sofrerem punições ao recusarem um serviço, “nesse caso seria autonomia”, argumenta Silva.

Representante da AMA-RJ, associação de motoristas do Rio de Janeiro, Marcelo Adifa é contra o reconhecimento do vínculo empregatício e defende que “uma nova legislação não deve burocratizar as relações entre aplicativos e motoristas, mas garantir aos condutores direitos que eles hoje não possuem”.

Em nota, a Amobitec – que reúne 99, Amazon, iFood, Uber, dentre outras – também se manifesta contra o reconhecimento do vínculo empregatício nos moldes da CLT. Segundo o texto, as plataformas “acreditam que novos marcos regulatórios sobre a relação entre as plataformas e motoristas e entregadores precisam ser construídos de forma a se respeitar essa nova realidade da prestação de serviços”.

INSS e aplicativos

Empresas que assinam a carteira de trabalho pagam 20% sobre a folha salarial total de seus funcionários. Já o empregado pode ter até 14% de seu salário descontados, mas ganha direito a auxílio-doença, licença-maternidade e aposentadoria.

Atualmente, os aplicativos não contribuem para o INSS. Em abril, a Amobitec divulgou uma carta de princípios em que abordava o tema.

A entidade afirma que suas associadas “entendem a sua responsabilidade e estão dispostas a colaborar, contribuindo financeiramente e facilitando a integração dos motoristas e entregadores parceiros à Previdência”.

Segundo o questionário da Repórter Brasil, quase 86% dos entrevistados afirmam que as plataformas precisam contribuir para o INSS. Dos 13 representantes de trabalhadores, somente dois entenderam que os apps não devem ter essa obrigação.

Um deles é José Gilcemar Pereira, presidente da AMMAP, do Rio Grande do Sul. “As plataformas não devem ser obrigadas a fazer tal contribuição, visto que esse custo será repassado ao motorista”, argumenta.

INSS e trabalhadores

A maior parte dos que responderam o questionário (86%) também acha que motoristas e entregadores devem ser obrigados a pagar o INSS. Entretanto, o formato da contribuição não é consensual.

Diretor de políticas públicas do iFood, João Sabino defende a contribuição para o INSS, por meio de “um modelo onde haja retenção e repasse dos valores por parte das plataformas, e que esse valor seja dividido entre trabalhadores e plataformas, com as empresas arcando com a maior parte da contribuição”.

Edgar da Silva, da AMABR, concorda com a ideia da retenção. Como justificativa, ele cita a alta taxa de inadimplência de quem se formaliza como MEI e tem a cobertura básica do INSS, mediante uma contribuição mensal de R$ 60. Hoje, a cada dez microempreendedores, quatro deixam de pagar.

“A contribuição teria que ser proporcional por corrida, já que o entregador faz entregas para vários aplicativos”, defende Silva.

Limite de jornada

A limitação de jornada é um dos assuntos mais polêmicos. Dentre os 13 representantes de trabalhadores que preencheram o questionário, oito disseram ser necessária a imposição de um teto.

“Jornadas excessivas geram estafa e expõe profissionais e terceiros a acidentes”, justifica Agenor Pereira, presidente do Sintramotos, do Paraná.

Outros cinco se manifestaram contra a determinação de um limite de horas. “Se somos profissionais liberais, temos que ter liberdade”, diz Luiz Corrêa, do Sindmobi-RJ.

O representante iFood, João Sabino, classificou a discussão como “salutar”. Porém, fez a ressalva de que “qualquer iniciativa nesse sentido deve levar em consideração a característica multiplataforma dos trabalhadores e a não existência do vínculo empregatício”.

Pagamento mínimo

No total, 78,6% dos representantes que preencheram o questionário acreditam que é necessário estabelecer regras mais claras sobre a remuneração.

“Precisaria ser discutido entre as partes”, defende Euclides Júnior, do Sindtapp, representante de motoristas do Pará. “Nós precisamos de um piso, até porque as plataformas não conversam com a categoria”, complementa Cléber Cardoso Silva, presidente de uma associação de condutores no Mato Grosso.

Seguros e representação

Para 85% dos que responderam o questionário, as plataformas precisam garantir seguros – em caso de morte ou acidente – mais acessíveis do que os ofertados atualmente.

“Quando o entregador precisa, às vezes não pagam”, critica Edgar Silva. “E não é só na entrega, como alguns aplicativos oferecem”, acrescenta o presidente da AMABR, que defende a cobertura também para os intervalos entre as corridas, por exemplo.

Só em uma pergunta houve unanimidade: a importância da representação de trabalhadores na negociação de direitos com as empresas, por meio de sindicatos ou associações.

“Hoje os motoristas e entregadores só têm voz por conta das associações, portanto, qualquer alteração das regras e mecanismos de trabalho entre as partes deve contar com a participação das entidades”, finaliza Marcelo Adifa, da AMA-RJ.

Fonte: UOL Economia

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